23.5.08

Diplomacia pelas janelas

Dele, só sei que gosta de pizza, de receber amigos e que é insone. Tinha uma namorada, mas acho que é coisa do passado. Atualmente, fica acordado até altas horas, geralmente sozinho, acompanhado apenas pela luminosidade de uma tela, que só pode ser o monitor do computador.

A televisão tenho certeza de que fica num outro cômodo, no quarto, imagino. Nunca trocamos uma palavra e eu não o reconheceria se dividíssimos a mesma calçada ou nos encontrássemos na fila padaria. Mesmo assim, eu e meu vizinho de frente selamos acordos silenciosos.Temos até certa intimidade, eu diria.

Da primeira vez que me dei conta de estar sendo observada desde o outro lado da rua, gelei. Era noite e eu molhava minhas plantas, completamente à vontade e sem roupa nenhuma, meu traje preferido de andar em casa. Com o jarro de água nas mãos, vi aqueles dois homens amparados na ampla janela, bebendo cerveja, as vistas fincadas no meu universo particular.

Quis me vestir, fechar a persiana, cavar um buraco no chão da sala, desaparecer. Mas em vez disso, agi com naturalidade. Respirei fundo e segui salvando as flores e os temperos do clima seco de Brasília.

Depois de alguns episódios desses, meu nu virou trivial e nunca mais ele e seus convidados pararam o que estavam fazendo para ficar espiando a vizinha peladona do quarto andar. Eu também já me acostumei a vê-lo andando pra lá e pra cá apenas de cuecas ou só com a toalha alaranjada enrolada na cintura, logo após sair do banho.

É o que eu chamo de triunfo diplomático da boa vizinhança. Nem ele analisa meus peitos nem eu reparo na marquinha de sunga dele.

1 comentario:

Anónimo dijo...

è bem assim, o silêncio fala mais que palavras!!! da mucra