Confesso
Dia destes quase senti inveja de mim. Era uma quarta-feira e o relógio digital do Parque Olhos d'água marcava 16:02. De tênis, top e short, em plena tarde de um dia comum de trabalho, eu estava lá. Era eu mesma, juro. Pronta para correr pelo menos meia hora, alongar o corpo mansamente, fazer meia dúzia de anotações mentais e, em seguida, me esbaldar sem pressa num coco bem gelado.
Sempre tive curiosidade de conhecer a Brasília de quem não cumpre expediente. Estou absolutamente convencida de que no horário comercial este lugar é outro. Conheço a cidade dos trabalhadores, que saem pela manhã de casa e retornam quando o dia escurece. Correm no Parque depois das 19h, com suas caras cansadas. Vão ao supermercado após as 21h e andam sempre apressados pelas ruas, especialmente nos intervalos de almoço, às voltas de agências bancárias com seus boletos atrasados nas mãos.
Mas no meio da semana os frequentadores das calçadas são diferentes. É uma gente leve, com frescor de quem acorda depois das 10h e lê alguma coisa enquanto escuta música. De quem toma banho após o almoço e sai para secar os cabelos na rua. São na maioria aposentados, estudantes, crianças, donas de casa. Alguns parecem tão ávidos que se diria que estão apenas de férias e por isso aproveitam ao máximo este cotidiano extraordinário. Outros, simplesmente não sei.
Fico tentando adivinhar o que faz esta gente que pode caminhar a passos lentos por aí, com seus corpos descontraídos, aparentemente sem urgências nem prazos a cumprir. Sempre desconfiei de que a vida realmente acontecia enquanto eu trabalhava o dia inteiro, mas não imaginava que fosse tão intensa. Só sei que é muito bom ter algum controle sobre o próprio horário e, melhor ainda, assumir sem culpa nenhuma que se tem tempo livre.
1 comentario:
Belíssimo
Uma das melhores coisas da vida está em exercer o direito à irresponsabilidade de vez em quando
desafinando o coro dos contentes
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