27.4.06

Descaber (I)

Vinícius me ligou perto do horário do almoço. Sílvia, dá um pulo aqui mais tarde. Tenho algo essencial pra te falar. O que poderia ser tão importante, eu pensava equanto mastigava 32 vezes a soja em grãos. Tês meses sem dar notícia. Sem responder e-mail, sem retornar ligações.

Ouvi dizer que esteve no Nepal. Seja lá o que for, nada dele é imprescindível pra mim. Nada nele. Não mais. Nos últimos tempos, só ioga, meditação, literatura e comida natural. E um pouco de sexo, vá lá, que o corpo pede.

Três meses. Noventa dias. Muito estranho este jeito que a gente arranjou de contar o tempo, a vida. Mudei de emprego. De casa. De hábitos. Me sinto ocasionalmente apaixonada pelo Gustavo. (O amor é circunstancial?) A samambaia morreu. E meu rosto no espelho é outro.

Eu ligaria de volta e diria que, desculpe eu havia esquecido, infelizmente tenho horário marcado no dentista. Não, no ginecologista. Na massagista. Eu tinha outro compromisso, ora. E não interessava qual fosse, era mais importante que ele. Estava decidido. Eu não iria. Depois das 20h, Vinícius disse. Eu não estaria lá.

Ou ele pensaria que eu estava solitária, erma, eternamente disponível. E de certa foma eu estava. Egocêntrico que é, imaginaria que eu aguardava apenas por aquele telefonema, aquela voz rouca e seca do outro lado da linha. E, de alguma maneira, eu aguardava. A mesma sensação de quando a gente fez amor pela primeira vez. De que era por aquilo, e só por aquilo, que eu esperava. Não sei bem como tudo aconteceu.

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