8.6.11

Assentamento comemora 13 anos de produção orgânica


O ano era 1998, mas o agricultor Almerindo Trevisan lembra como se fosse ontem aquele mês de dezembro em que pisou pela primeira vez na área de 9.500 hectáres situada em Viamão (RS), município da Grande Porto Alegre, que deu origem ao Assentamento Filhos de Sepé.


"Éramos mais de 350 famílias querendo trabalhar na terra. Mudamos de mala e cuia para cá. Ainda não havia amanhecido quando chegamos de ônibus e o tempo estava para chuva. As coisas da gente chegaram horas depois, de caminhão, e nós armamos nossos barracos de lona debaixo d'água", recorda.


As moradias improvisadas permaneceram de pé por sete meses, até o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) regularizar a situação dos lotes de cada família. "Nós chegamos aqui com muitos sonhos e pouca experiência. Tínhamos a ideia de logo montar uma cooperativa mas só conseguimos fazer isso bem depois", detalha seu Almerindo, que trabalha no campo desde menino e garante que nunca pensou em desistir.

"Eu tenho 58 anos e sempre batalhei pela produção orgânica. Hoje tem muita gente que reconhece a importância disso, mas noutros tempos não era bem assim e a gente era taxado de louco, inclusive aqui, dentro do Assentamento" conta Almerindo.

Segundo ele, no início as divergências entre os assentados foram um entrave. Tanto que a briga por um modelo de desenvolvimento agrícola auto-sustentável, com a preservação dos recursos naturais, extrapolou os limites do assentamento e teve que ser levada ao Ministério Público.



"A vitória veio para o lado de quem manteve o compromisso de produzir orgânico e de quem botou o assentamento acima dos interesses individuais", sustenta.


O saldo dessa disputa judicial, relata seu Almerindo, é que algumas famílias foram embora e outras tiveram que aderir à produção livre de agrotóxicos. Não poderia ser diferente: todo o assentamento está localizado numa reserva ambiental que leva o nome de "Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos”, com aproximadamente 2.500 hectáres de Áreas de Preservação Permanente, com diversas nascentes, açudes e cursos de água.

"Foi uma situação complicada, tivemos que botar a cara para bater, mas deu certo: depois disso conseguimos montar a cooperativa e fugimos das mãos dos travassedores", afirma. 




Hora da colheita
De acordo com o técnico agrícola que atua no local, Edvane Portela, após a formalização da Cooperativa dos Produtores Orgânicos da Reforma Agrária (Coperav), da qual participam 62 famílias, a produção de arroz orgânico foi fortalecida.



"Este ano tivemos nossa safra recorde, com 80 mil sacos de arroz", comemora Edvane. Além do arroz, os agricultores se dedicam à horticultura (na foto ao lado), ao plantio de frutas e à produção de leite, carne e ovos. O próximo passo, aponta Edvane, é investir numa agroindústria para o beneficiamento de artigos como mel, queijos e embutidos.

Diferente de outros assentamentos que se deparam com o obstáculo do escoamneto da produção, a localização privilegiada do Filhos de Sepé facilita o comércio dos produtos. "Estamos na Região Metropolitana, que é o maior parque consumidor do Estado", pontua Edvane.



No entanto, ainda é preciso melhorar na gestão administrativa da cooperativa. Atualmente, a maior parte das vendas é feita para a Companhia Nacional de Abastecimento.


Construção da padaria
A alimentação escolar também é um mercado importante para o assentamento, já que a Lei Federal 11.947, de 2009, determinou que a rede pública de ensino deve priorizar a aquisição de produtos da agricultura familiar para oferecer aos alunos.

Desse novo nicho também nasceu a necessidade de montar um padaria e, desde o ano passado, um grupo de 10 mulheres assentadas está a frente do empreendimento. "Nós fazemos cucas, biscoitos e pães para os colégios. A padaria abriu um novo horizonte para mim e estou muito feliz com o que eu faço", conta a trabalhadora Solange Pietroski.

Na avaliação de seu Almerindo, o Filhos de Sepé está vivendo o seu melhor momento. "Temos uma visão de futuro e ela é de muito trabalho. Passamos por uma perseguição e tivemos uma briga feia na disputa de projetos. Agora, o caminho é continuar vivendo da terra e produzindo", defende o agricultor.

Satisfeito, ele levanta da cama todos os dias antes das seis horas, toma seu chimarrão, um bom café da manhã e parte para a labuta diária, um trabalho que vai até o cair da tarde e inclui cuidar de plantações e de animais. "Quando chegamos aqui eu era um homem cheio de esperanças e hoje continuo um homem cheio de esperanças", garante.

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